14 de fevereiro de 2021
14 de fevereiro de 2021

Suprema Corte do Reino Unido permite recurso em um litígio de grupo envolvendo a Shell

Em uma decisão inovadora, a Suprema Corte do Reino Unido permitiu um recurso em um litígio de grupo contra a empresa de petróleo e gás Shell plc.

A decisão permitirá que 42.500 vítimas nigerianas continuem sua luta por justiça na Inglaterra.

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Após uma audiência realizada em junho de 2020, a Suprema Corte do Reino Unido permitiu, na semana passada, um recurso da decisão da Corte de Apelação no caso Okpabi e outros (Recorrentes) contra Royal Dutch Shell Plc e outros (Recorridos) [2018] EWCA Civ 191.

O litígio em andamento envolve 42.500 indivíduos, todos membros das comunidades de Ogale e Bille, na Nigéria, que tiveram sua saúde e subsistência afetadas pela poluição contínua e pelos danos ambientais causados por vazamentos de petróleo.

Os vazamentos de petróleo na região onde as vítimas residem são provenientes de oleodutos e da infraestrutura associada operada como parte de uma joint venture por um dos entrevistados.

Jurisdição e dever de cuidado

A apelação dizia respeito à jurisdição dos tribunais ingleses contra a Shell Petroleum Development Company of Nigeria Ltd ("SPDC"), uma empresa nigeriana, e se a empresa controladora inglesa, a Royal Dutch Shell Plc ("RDS"), tinha um dever de cuidado de direito comum para com os afetados.

As vítimas argumentaram que a empresa inglesa RDS devia a elas um dever de cuidado devido ao controle significativo que a RDS exercia sobre as operações da SPDC.

A Suprema Corte considerou que há, de fato, um caso discutível para a RDS ter um dever de cuidado e permitiu o recurso.

Nossos advogados ofereceram um resumo da sentença, destacando e analisando os pontos principais.

1. Erros materiais de direito

- Os pedidos de jurisdição não devem resultar em um "mini-julgamento

A Suprema Corte considerou que o Tribunal de Apelação conduziu erroneamente um "mini julgamento" e errou em sua abordagem à análise das provas, contrariando a orientação fornecida pela Suprema Corte em casos anteriores, incluindo Vedanta Resources PLC e outros (Recorrentes) v. Lungowe e outros (Recorridos) [2019] UKSC 2.

De acordo com o julgamento da Suprema Corte em Okpabi, em aplicações jurisdicionais destinadas a determinar se há uma questão real a ser julgada entre as partes, as alegações de fato feitas em apoio a uma reivindicação devem ser aceitas, a menos que sejam "comprovadamente falsas ou sem suporte" [101-109].

- Uso de políticas e diretrizes para todo o grupo

No caso da Vedanta, a Suprema Corte decidiu que os documentos de governança corporativa são de fundamental importância para determinar se uma empresa controladora tem o dever de cuidar dos atos de sua subsidiária.

À luz de sua decisão anterior no caso Vedanta, a Suprema Corte em Okpabi decidiu que a Corte de Apelação havia errado ao decidir que a promulgação de políticas ou padrões de todo o grupo por uma empresa controladora nunca pode, por si só, dar origem a um dever de cuidado.

- Volume de evidências

A Suprema Corte reiterou a importância da proporcionalidade ao decidir sobre questões jurisdicionais e observou que o arquivamento de grandes quantidades de material probatório (mais de 2.000 páginas de provas foram invocadas pelas partes em Okpabi) era inadequado [20-23].

- Controle

A Suprema Corte também decidiu que a maioria do Tribunal de Apelação tratou de forma inadequada a noção de controle.

Aplicando a abordagem de Lord Briggs no caso Vedanta, a Suprema Corte considerou que o fator mais relevante a esse respeito é se a empresa controladora assumiu efetivamente a administração de sua subsidiária, no todo ou em parte.

Além disso, a Suprema Corte enfatizou que uma subsidiária pode manter o controle de jure de suas atividades, mas "ainda assim, delegar a gestão de fato de parte delas a emissários de sua matriz" [147].

- Não é uma nova categoria de dever de cuidado

Reafirmando sua decisão no caso Vedanta, a Suprema Corte esclareceu que a conclusão de que uma empresa controladora pode ter o dever de cuidar das atividades de suas subsidiárias não se baseia em uma "categoria distinta de negligência de direito comum" [25] e que o Tribunal de Apelação havia errado nesse sentido ao aplicar o teste Caparo v Dickman aos fatos da Okpabi.

2. Implicações para litígios internacionais

A decisão da Suprema Corte no caso Okpabi, em consonância com seu julgamento anterior no caso Vedanta, demonstra o potencial de as vítimas buscarem reparação de empresas multinacionais sediadas na Inglaterra pelos atos ilícitos de suas subsidiárias no exterior.

Embora algumas questões jurisdicionais permaneçam pendentes no caso Okpabi, a decisão da Suprema Corte já reforça o precedente estabelecido pela Vedanta no sentido de que os tribunais ingleses não hesitarão em responsabilizar as empresas domiciliadas na Inglaterra pelos danos causados a indivíduos e ao meio ambiente, seja no Reino Unido ou no exterior.

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