Vitória histórica: Justiça inglesa declara BHP culpada pelo desastre de Mariana 

November 14, 2025

Tribunal responsabiliza mineradora dona da Samarco pelo rompimento da barragem com base na legislação ambiental e no Código Civil brasileiros; confirma que todos os autores estão dentro do prazo prescricional e reconhece a legitimidade dos municípios para processar na Inglaterra 

A Justiça da Inglaterra decidiu que a BHP é culpada pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), ocorrido em 2015. Divulgada nesta sexta-feira (14), a decisão histórica afirma que a mineradora tinha conhecimento do risco de ruptura muito antes do colapso e deixou de adotar as medidas necessárias para evitar a mais devastadora tragédia socioambiental da história do Brasil. 

A sentença representa um marco para as vítimas, que há dez anos buscam a responsabilização efetiva das empresas envolvidas no desastre. A ação coletiva é conduzida pelo escritório internacional Pogust Goodhead e reúne milhares de atingidos, que acionaram a BHP em jurisdição para a qual a mineradora envia lucros obtidos com a extração de minério no Brasil. Esta é a primeira decisão no caso a declarar formalmente a responsabilidade de uma das corporações envolvidas e constitui um avanço notável para a justiça ambiental global. 

A juíza Finola O’Farrell rejeitou as tentativas da BHP de limitar sua responsabilidade e autorizou o avanço do processo para a fase de avaliação dos danos, com base na legislação ambiental e no Código Civil brasileiros. 

Uma decisão histórica 

Poluidor indireto – Em uma decisão detalhada, a juíza Mrs Justice O’Farrell DBE considerou a BHP responsável como poluidora, tanto sob a legislação ambiental brasileira quanto com base em culpa prevista no Código Civil brasileiro. A juíza confirmou que qualquer pessoa física ou jurídica direta ou indiretamente responsável por atividade poluidora é tratada como poluidora, |incluindo aqueles que controlam, financiam, participam ou lucram com a atividade, ou que criam o risco que ela representa. 

Negligência e imprudência – O Tribunal concluiu que o colapso da barragem foi causado pela negligência, imprudência e/ou imperícia da BHP. A juíza identificou provas “esmagadoras”, anteriores ao colapso, de que a barragem era instável e de que o risco de liquefação e ruptura era previsível e poderia ter sido evitado. A BHP tinha conhecimento de graves defeitos e de claros sinais de alerta desde, pelo menos, agosto de 2014, mas não adotou medidas corretivas adequadas e, em vez disso, continuou a elevar a barragem, o que resultou no colapso. 

Controle e operação – As provas apresentadas ao Tribunal mostraram que, ao contrário do que a BHP afirmou por uma década, a empresa, juntamente com a Vale, controlava e operava a Samarco, era sua “mente diretiva”, participava de suas operações desde as decisões estratégicas até o dia a dia, havia assumido a responsabilidade pela gestão dos riscos da barragem e tinha feito investimentos substanciais na Samarco, da qual também extraía benefícios financeiros e comerciais significativos. 

Sem barreira de prazo – O Tribunal rejeitou as tentativas da empresa de limitar sua responsabilidade e concluiu que os processos criminais relativos ao colapso da barragem adiaram o início do prazo prescricional para, pelo menos, setembro de 2024. A juíza decidiu que as vítimas podem apresentar ações até, no mínimo, setembro de 2029, e que alguns autores podem se beneficiar de prazos ainda mais longos, dependendo de suas circunstâncias individuais. 

Legitimidade dos municípios – A sentença confirma que os municípios brasileiros têm legitimidade para prosseguir com suas ações na Inglaterra. Atualmente, 31 municípios fazem parte do processo e, embora sua legitimidade tenha sido contestada pelas mineradoras no Supremo Tribunal Federal (STF), a Corte inglesa decidiu agora que eles podem continuar litigando. 

Quitações – O Tribunal decidiu que o alcance de qualquer quitação assinada por pessoas que aderiram a programas de compensação por meio da Renova ou da Repactuação depende dos termos específicos e das circunstâncias de cada acordo, de acordo com as regras de interpretação de contratos previstas no Código Civil. A Corte também concluiu que o Código de Defesa do Consumidor não se aplica a esses acordos. 

Busca por justiça 

Para representantes dos atingidos, o julgamento representa uma virada na busca por justiça. “Tivemos que atravessar o Oceano Atlântico e ir até a Inglaterra para finalmente ver uma mineradora ser responsabilizada. Essa vitória dá esperança a todos nós que fomos afetados, especialmente às famílias das vítimas falecidas e dos mais de 80 moradores de Bento Rodrigues que morreram sem receber suas novas casas”, comentou Mônica dos Santos, membro da Comissão dos Atingidos pela Barragem do Fundão e do grupo de moradores Loucos por Bento. 

Gelvana Rodrigues, que perdeu o filho de sete anos arrastado pela lama em Bento Rodrigues, destacou o impacto da decisão. “Finalmente a justiça começou a ser feita, e os responsáveis foram responsabilizados por destruir nossas vidas. Prometi a mim mesma que não descansaria até que os responsáveis fossem punidos pela morte do meu filho Thiago. A decisão da juíza mostra o que temos dito nos últimos 10 anos: não foi um acidente, e a BHP deve assumir a responsabilidade por suas ações”, disse.  

A CEO do Pogust Goodhead, Alicia Alinia, reforçou que a sentença estabelece um importante precedente de caráter global. “Esta decisão envia um recado claro para multinacionais no mundo todo. Não é possível ignorar o dever de cuidado e simplesmente se afastar da destruição causada. A responsabilidade está estabelecida. A BHP agora deve responder e pagar o que é devido”, ressaltou.  

Para o tribunal britânico, alguns acordos e renúncias firmados no Brasil impedem que determinadas vítimas continuem na ação na Inglaterra. O escritório sustenta que esses programas não contemplam integralmente as perdas das vítimas e irá solicitar permissão para recorrer, em paralelo ao andamento da fase 2, para evitar atrasos no processo como um todo. As partes poderão solicitar permissão para recorrer em até 21 dias após a decisão.  

A ação segue agora para a etapa de avaliação dos danos. Uma Audiência de Gerenciamento do Caso foi marcada para 17 e 18 de dezembro de 2025, e o julgamento da fase 2 está previsto para outubro de 2026.   

 O caso  

O desastre de Mariana ocorreu em 5 de novembro de 2015, quando a barragem de Fundão se rompeu, liberando mais de 40 milhões de toneladas de rejeitos que percorreram 675 quilômetros até o Oceano Atlântico. A tragédia deixou 19 mortos, causou o aborto de um bebê e gerou danos socioambientais ainda sentidos em toda a região. O processo tramita no Reino Unido porque a BHP é uma empresa estrangeira que estava listada na Bolsa de Londres à época, permitindo que vítimas buscassem reparação na jurisdição inglesa.  

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